• 21 de outubro de 2004
O Comitê de Política Monetária resolveu dobrar a dose de aumento dos juros e elevou a taxa Selic em mais 0,50 ponto percentual, para 16,75%. O reforço do aperto monetário está em linha com o cenário traçado pelo Copom há meses e cuja linha de força principal é a de que o ritmo de crescimento da economia está acima da capacidade de produção, estimula a elevação dos preços e ameaça as metas de inflação. O panorama de curto prazo, entretanto, mudou para melhor desde a última reunião do comitê. Muitos analistas que participam da pesquisa Focus e que influem na expectativa de inflação - e que apostam na alta - desta vez manifestaram dúvidas sobre a necessidade de mexer nos juros. Não duvidaram, porém, da palavra empenhada do Copom em suas últimas atas, que traçou uma trajetória ascendente da Selic, embora já não estejam tão confiantes a respeito de suas premissas. O Banco Central prevê que ameaças futuras vão suplantar as boas notícias do curto prazo. Há a certeza de novo aumento dos combustíveis, já que os preços do petróleo atingiram um nível mais alto e preocupante, na casa superior dos US$ 40 o barril. Com a expectativa de inflação para 2005 próxima da casa dos 6%, o risco pode se tornar relevante para um teto da meta de 7%. Pode-se dizer, porém, que o poder dos combustíveis de causar estragos na inflação é semelhante ao que vem sendo observado nos países desenvolvidos, isto é, pequeno. No Brasil, tem sido até menor, dada a política da Petrobras de privilegiar a composição real dos custos, preponderantemente em reais, do que para as vantagens do alinhamento imediato às cotações internacionais. Em suma, a ameaça do reajuste dos combustíveis tende a ser magnificada diante do irrealismo das metas de inflação. O conservadorismo do BC está em boa parte ancorado na previsão de que a economia não conseguirá crescer sem pressões inflacionárias ao ritmo já observado atualmente. Há bons motivos para se duvidar disso. Os últimos indicadores foram todos positivos e apenas recomendavam uma atitude acomodativa do BC, de manter as taxas. Houve uma importante descompressão dos preços no atacado, a começar pela previsível deflação dos alimentos, mas também pelo recuo de 50% dos produtos industriais nos IGPs. Há um resquício importante dos fortes aumentos das commodities minerais e dos bens que utilizam aço e plástico. O importante, porém, é que esses preços, determinados pelo mercado externo, parecem ter batido em seu teto e podem começar a declinar. Há analistas que acreditam que a "bolha" das commodities começou a ser furada, o que pode ser uma aposta prematura. Houve a ajuda importante da valorização do real para o recuo dos IPAs e a contribuição de alguma acomodação dos preços externos dos insumos que puxaram os índices internos. Restaria a ameaça de uma demanda interna forte o suficiente para sancionar reajustes e empurrar a inflação para cima. Os indicadores da produção industrial continuam apontando para cima, em uma velocidade um pouco superior ao das últimas retomadas. Os índices de emprego, porém, têm reagido com menor força, o que indica crescimento da produtividade do parque industrial e maiores investimentos - indícios reforçados pelo aumento acima de 20% no ano da fabricação de máquinas e equipamentos. Tão importante quanto a marcha atenuada das contratações é a evolução da folha de pagamento, que vem apresentando oscilações em torno do zero no curto prazo. Até agosto, o último dado disponível, o total dispendido com salários avançou 9,6%, um percentual suficiente apenas para ensejar a recuperação do consumo, porém claramente insuficiente para criar uma pressão incontrolável de demanda. Os ganhos reais dos salários ainda são modestos. Basta compará-los com a inflação em 12 meses do IPCA, que baliza as metas de inflação - 6,7% em setembro - ou com o IGP-DI, de 11,74%, para se constatar que a massa salarial oscila entre um pequeno ganho real e uma pequena perda diante da inflação. O arrefecimento da velocidade das vendas no varejo é um sinal a mais a ratificar a força moderada das pressões de demanda. A armadilha que o governo não desarma é a da busca de metas apertadas demais em um intervalo de tempo irreal. Ou, ainda, a de, após dez anos do vitorioso fim da indexação , o país conviver com sua manutenção para setores que têm o poder de detonar os índices de inflação. O peso da política monetária continua a recair sobre os setores competitivos, poupando os monopolistas ou de pouca concorrência e tornando o preço para se atingir as metas desnecessariamente custoso para o país. Fonte: VALOR ECON?MICO - OPINI?O Data: (21/10/2004)